De uma maneira ou de outra, creio que todos sabem que treinar o "core" é importante, tanto para corridas curtas, como para aguentar os esforços mais prolongados das ultra maratonas. No entanto, os treinos típicos de abdominais feitos à bruta (sessões intensas, com muitas repetições e recuperações curtas) contribuem pouco para correr melhor e dão-nos poucos dos benefícios de estabilidade, que é aquilo que devíamos procurar quando treinamos o corpo, seja para correr ou para as funcões do dia a dia.
Porque é que o "core" é tão importante para correr?
Quando corremos, a zona da anca, o tronco e os ombros (o verdadeiro pilar do "core") desempenham o papel de âncoras, onde se vão fixar e movimentar os braços e as pernas. Sem um "core" forte e estável, os nossos membros simplesmente ficariam pendurados sem controle. Idealmente, os músculos ligados a esse pilar têm que se comportar de forma integrada, num complexo sistema de contrações e alongamentos, de acordo com o movimento que cada membro faz. Isto faz com que cada um tenha que ser forte e rígido para manter o controlo de cada passada, mas também suficientemente flexível para resistir às constantes solicitações de contração e extensão.
As bases
Em cada passada o nosso corpo absorve pelo menos 3,5 vezes do nosso peso corporal. Portanto, o reforço do pilar central do tronco terá idealmente que compreender treinos com cargas maiores que o nosso peso corporal. Também deve incluir atividades complexas que desafiem o "core" a procurar a estabilização e a coordenação, com movimentos de balanço e de mudanças de nível. Façam a maior parte dos exercícios em pé, já que essa é a posição natural em que corremos.
Sincronizem os treinos do "core" com os treinos de corrida
Assim que tenham o vosso conjunto de exercícios, agendem os mesmos por forma a que se encaixem nas vossas limitações de tempo. Isto fará com que sejam mais consistentes nos treinos e não deixem de treinar aquele número de sessões semanais que planearam.
Treino do "core" antes do treino de corrida
Um pequeno e breve treino do "core" (skipping, alongamentos dinâmicos, etc) antes de ir correr pode servir perfeitamente de aquecimento. Se fizerem 10 minutos de treino antes de cada sessão de corrida, podem facilmente acumular 40 ou 50 minutos de treino de "core" todas as semanas, o que é um excelente volume de treino de força semanal.
Treino do "core" depois do treino de corrida
Os benefícios de fazer algum treino de "core" depois de correrem é que vão treinar já com os músculos maiores (glúteos, quadrícipetes, etc) em estado de fadiga. Se fizerem algumas pranchas ou outro tipo de exercícios com peso do corpo, vão desafiar os músculos mais pequenos e profundos.
Treino normal do "core"
Para realmente desafiarem os músculos do tronco e abdominais, treinem com cargas mais pesadas quando se sentires frescos. Mais do que quando os músculos estão fatigados, assim frescos conseguirão coordenar-se mais facilmente e ser mais explosivos. Intercalem exercícios de maiores cargas, com outros de peso do corpo, como pliométricos, etc.
Escolham exercícios que gostem de fazer e que melhorem a vossa forma de correr. Escolham protocolos que consigam manter, ao longo do tempo que dura o vosso plano de treinos. Um pouco de progressão a cada dia é a chave para se manterem saudáveis e em boa forma física.
Começo este post com uma pergunta: será que conseguiriam terminar uma maratona treinando apenas 3 dias por semana? Parece bom demais para ser verdade... Mas o facto é que, se são leitores deste blog e leram o meu recente post A culpa foi do "puôbo", comprovadamente eu consegui fazê-lo. O "como" é o que vou tentar explicar de seguida.
A maior parte dos planos de treino que se podem encontrar online sugerem entre 5 e 6 dias de treino semanais, para se estar preparado para fazer uma maratona. Sim, é mais ou menos isto que se recomenda. Mas este volume faz com que um plano de treinos facilmente vos faça acumular 50km semanais de corrida, ou mais. Para quem tem propensão para as lesões, ou tem pouco tempo disponível para trabalhar, treinar, tratar da vida pessoal e ainda repousar, estes planos de treino podem ser algo exagerados. Isto porque, sem o devido tempo para recuperação, é natural que o stress se acumule e se notem sinais (uns mais óbvios que outros) de overtraining.
Assim, afirmo que é perfeitamente possível treinar para uma maratona com apenas 3 dias semanais de corrida. O truque está em fazer as coisas da forma mais adequada a cada um, estando o mais atento possível aos sinais que o corpo nos dá, treinando quando devemos treinar, o que devemos treinar, e também descansando quando assim for necessário. E, no meio de tudo isto, seguir estas indicações muito simples:
1. Mantenham a corrida uma coisa divertida
Treinar só 3 vezes por semana faz com que correr não seja uma obrigação diária e vai tornar a corrida mais acessível aos entusiastas da modalidade e a potenciais maratonistas. As restrições no volume de treino vão ajudar a diminuir o stress por excesso de treino (ou até mesmo o esgotamento). Se a isto juntarem alguns dias de cross-training, não só diminuem o risco de lesão, como provavelmente ficam mais aptos para correr mais rápido!
2. Corram só 3x por semana
Façam só 3 treinos de corrida por semana:
Um treino longo;
Um treino por tempo (tempo training);
Um treino de velocidade.
Cada um destes treinos tem um objetivo específico, tais como melhorar a capacidade aeróbia, o limiar do lactato, a eficiência energética a correr, ou a potência e a velocidade. Cada um deles deverá ser adaptado à pessoa em causa, com mais ou menos intensidade, respeitando sempre a resposta que o corpo nos dá, mas procurando sempre o resultado pretendido.
A maior parte das pessoas tende a manter os treinos num nível tolerável. Isto faz com que não consigam obter todos os benefícios da adaptação física que poderiam conseguir nos treinos. É verdade! Só quem treina num nível elevado e fora da caixa consegue obter os benefícios físicos de um treino a sério. Já ouviram dizer: "treinar fácil nos dias de treinos fáceis, treinar no duro nos dias de treinos mais duros!"? Pois se as corridas leves devem ser mesmo leves, já as mais difíceis devem ser feitas num nível muito elevado. É neste nível que, muitos de nós, ao sentirmos a fadiga, baixamos o ritmo. Da próxima vez que tiverem que treinar forte, treinem mesmo forte! E aqui faço como apregoava uma certa marca: se tiverem dúvidas, perguntem-me como! ;)
3. Podem parar de fazer treinos longos à bruta!
A maior parte das pessoas pensa que para fazer uma prova de uma determinada distância, tem que treinar a correr essa distância. Completamente errado! Por exemplo, um plano de treinos típico para uma maratona deve incluir um treino longo de 35 km, que deverá acontecer cerca de 3 semanas antes da prova. Esta é a distância máxima que se deve correr quando se treina para uma maratona. E mesmo assim, o caminho para lá chegar deve ser progressivo, ou seja, devemos ir acrescentando volume semanal aos poucos, recuperando, voltando a acrescentar volume, até chegarmos a essa distância.
Até aqui parece simples. O que não é assim tão simples é que um dos objetivos deste treino longo é tirar-vos da caixa, ou seja, correr a um ritmo superior ao que será suposto fazerem na prova (todos temos o nosso objetivo, certo?), mais uma vez adequado ao que cada um consegue fazer. A título de exemplo: se eu sou capaz de correr 10km a 4'30/km, devo fazer este treino longo somente um pouco mais lento... digamos entre 15'' ou 30'' mais lento por km.
4. Pratiquem outras modalidades 2x por semana
Há um programa de treino muito conhecido como o treino 3+2, o que significa que, para 3 dias de corrida semanal, devem intercalar com 2 dias de treino de outra modalidade qualquer. Experimentem variar o estímulo com coisas como natação, bicicleta, ou treino de força, no ginásio. Praticar outras modalidades permite manterem o nível de preparação física, sem acumular o stress da repetição da corrida. Mas apliquem-se! No ginásio, por exemplo, tirem o melhor partido das sessões, mesmo que sejam de apenas 30 minutos. Isto vai fazer com que melhorem a vossa aptidão física, diminuir o risco de lesão, tornando-vos mais fortes para correr no dia seguinte.
5. Não percam tempo a tentar recuperar o tempo perdido
Um plano de treinos típico para uma maratona dura entre 16 a 21 semanas e, neste período de tempo, muita coisa pode acontecer: um pé torcido, uma gripe, uma deslocação em trabalho, etc. Isto vai fazer com que tenham que falhar alguns dos dias de treino e, depois, sintam que devem de alguma forma compensar estes dias com treinos a dobrar. Não façam isto, por favor! Duplicar os treinos só vos vai fazer acumular mais cansaço, além do stress (mental) que isso implica. Em vez disso, aceitem o que vos aconteceu e reagendem o vosso calendário, por exemplo, para recomeçar no momento em que pararam, ou um pouco antes. Mais importante ainda: se tiveram que parar por causa de uma lesão, foquem-se em tratar o vosso problema completamente, antes de retomar os treinos. Caso não possam mesmo alinhar na prova que tanto queriam, não desesperem. Afinal de contas há tantas provas à vossa espera ao longo do ano!
6. Reservem 3 semanas para descansar
Como disse no ponto 3, o treino mais longo num plano de treinos para uma maratona deverá acontecer mais ou menos 3 semanas antes da prova. Ao longo destas últimas 3 semanas, os treinos longos diminuem a distância, assim como os treinos mais curtos também diminuem a intensidade de forma gradual. É importante não abusar nestas últimas semanas, já que elas vão permitir uma boa recuperação antes da maratona, mantendo um nível de intensidade para que o corpo não se sinta preguiçoso. Se mesmo assim se sentirem "amolecer" na semana antes da prova, experimentem fazer uns sprints (6x100m) só para esticar as pernas depois dos treinos a meio da semana. Não se esqueçam de fazer sempre uns bons alongamentos no final.
Não ia preparado! Em jeitos de aviso, e para que ninguém se prendesse por minha causa, fui avisando desde cedo, bem antes da prova, que não ia preparado para correr a Maratona do Porto. Primeiro, fiz um plano de treinos, mas não o cumpri. A falta de tempo e as demasiadas coisas que tive para fazer - em dias que insistem só ter 24 horas - não me permitiram fazer mais do que um único treino longo de 30 km, umas semanas antes, e uns treinos mais curtos (mas intensos) pelo meio. Foi o que se pôde fazer. Depois, estava frio, ia chover e não conhecia o percurso. O resultado? A minha melhor maratona até agora! :) Como isso aconteceu é o que eu vou contar de seguida.
A culpa foi dos treinos!
Ainda estou para descobrir se a culpa de ter feito a minha melhor maratona (até agora) foi dos treinos que fiz, ou dos treinos que não fiz. Sim, leram bem, dos treinos que não fiz. Ainda nesta semana que passou, discutia lá no ginásio sobre o excesso de treinos e de corridas que algumas pessoas insistem em fazer, sempre na ânsia de assim se sentirem (mentalmente?) mais capazes de cumprir o seu objetivo. O que é certo é que correr demasiado também faz com que, ao longo do tempo, se acumulem nas pernas quilómetros e mais quilómetros de fadiga muscular. E depois, quem é que tira esse cansaço dos músculos, a tempo de ter uma boa prestação na prova principal? É que até podemos dizer que nos sentimos bem. Mas, "científicamente" falando, as reservas ficam diminuídas e será sempre mais complicado correr assim, do que correr depois de descansar a sério!
Não sei se já aqui contei a história do Carlos Lopes, que foi atropelado enquanto treinava na 2ª Circular, isto 15 dias antes de ir competir na maratona dos Jogos OIímpicos de Los Angeles. Há quem diga que foi graças a esse "descanso" forçado que ele conseguiu ganhar esta prova, aliás, com um recorde que veio a ser seu durante longos anos!
Portanto a culpa pode ser dos treinos que fiz - claro - mas também dos que não fiz.
A culpa também foi do equipamento...
A metereologia já anunciava que ia ser um fim de semana chuvoso. Ora se a isto juntarmos o frio e um pouco de vento, a manhã de domingo prometia não ser a mais amena. Assim, optei por levar uma tshirt térmica, uns manguitos, os calções duplos (boxer + calção) da Salomon e umas sapatilhas com o drop mais baixo com que estava habituado a treinar: 4 mm.
A tshirt térmica foi uma boa opção, porque foi capaz de regular a temperatura corporal ao longo de toda a prova. De facto, mesmo debaixo de chuva, ao tocar na tshirt toda ensopada, podia sentir que esta estava quente e que eu não sentia o mínimo frio, sinónimo de que a regulação da temperatura corporal estava a funcionar bem.
Os manguitos também foram uma boa escolha, porque protegeram contra o vento mais fresco que de vez em quando se fazia sentir, ou não estivessemos nós ao pé do mar. Além disso, se por acaso fizesse calor, seria uma opção fácil de tirar.
Os calções duplos são os calções interiores modulares S/Lab da Salomon que, juntos com o calção de fora, servem de proteção adicional contra o vento e o frio (e a chuva). O Modular Belt é a cereja no topo deste trio, pois encaixa-se com uns clips nos calções interiores e assim mantém-se sempre no mesmo sítio, mesmo se lhe dermos acidentalmente algum puxão ao tirar o gel do interior.
As sapatilhas escolhidas foram umas Saucony Kinvara 9, aconselhadas pelo Ricardo da 4Run, já que estou habituado a correr com sapatilhas de drop baixo, o que me facilita a adopção de um estilo de passada mais natural e coerente com a nossa biomecânica.
Foi também na 4Run que comprei a última moda em nutrição: o gel da Maurten, a tal marca que os "artistas" de elite (como o recordista Kipchoge e tantos outros) agora passaram todos a usar. A permissa desta marca, que só vende 2 produtos (gel e bebida energética) é fornecer o máximo de carbohidratos, com o mínimo de trabalho no estômago, coisa que ultimamente não me tem corrido muito bem em provas (sinto que tenho vindo a ficar cada vez mais intolerante a estas porcarias dos géis e das bebidas energéticas), mas que desta vez passou no teste com distinção! Sem quebras, a única coisa que senti mesmo a falhar nos últimos - vá lá - 5 quilómetros foram as pernas, que se ressentiram da falta de preparação com treinos mais longos. Eu bem me queria manter abaixo dos 4'30/km, mas nesta fase já estava a ser difícil.
A maior culpa foi mesmo do "puôbo"!
Já agora, falando da maratona propriamente dita, a juntar a tudo isto, a grande energia que senti ao longo de toda a prova foi mesmo do público! Já me tinham dito (mas claro, ver para crer) que o público presente na Maratona do Porto não tinha nada a ver com o público presente noutras provas no nosso país. E, de facto, o povo sai à rua para apoiar os atletas desta prova. Desde o tiro da partida, às 09h00, que é impossível não nos sentirmos verdadeiramente levados pelo apoio do público ao longo do percurso. Lembro-me de começar a chover logo no início da prova e de, mesmo assim, a rotunda do Castelo do Queijo ou da Anémona estar rodeada de pessoas a gritar por quem corrida!
E se isto era um facto em Matosinhos, na zona da Ribeira, em Gaia e na Ponte D. Luís... impressionante! Aqui era tanta gente que quase não via a minha mulher a gritar por mim no meio da multidão. E na reta da meta foi igual... gente e mais gente, aplausos e mais aplausos!!!
Assim sim! Assim é fácil correr bem. A todos vós, tiro o meu chapéu. E só espero que da próxima vez o S. Pedro nos dê um pouco mais de descanso e traga menos chuva do que este ano.
Em jeitos de conclusão, só posso acreditar que, por um lado, tudo é possível se trabalharmos de forma focada e consciente para o objetivo que pretendemos conquistar. Por outro lado, ajuda se nos lançarmos de cabeça limpa, sem pensamentos negativos e sempre com um sorriso na cara. Esta positividade é - acreditem - metade do trabalho! E na semana passada, na 15ª Maratona do Porto, bem que posso culpar o "puôbo" por me ter levado "de carrinho" até ao fim da prova. O "puôbo" no Porto, mas também os meus amigos, a minha família, a minha mulher (que apanhou uma grande molha só vir para bater palminhas), e os meus companheiros de corrida. À parte das coisas que não correram nada bem*, a Maratona do Porto é aquela prova que me vai sempre arrancar um sorriso de cada vez que me lembrar dela.
* As coisas que não correram nada bem nesta 15ª Maratona do Porto não tiveram a ver comigo, mas não as posso deixar passar ao lado. Tiveram a ver com a organização que, num dia que já se sabia que ia ser chuvoso à brava, não tomou as devidas previdências e deixou, no final da prova, centenas de atletas durante largas dezenas de minutos (eu fiquei meia hora, mas houve quem tivesse esperado 2 horas) à chuva e ao frio para recolherem o saco de roupa do bengaleiro. Bengaleiro? Não, não havia bengaleiro. Os sacos de roupa estavam no chão, sem qualquer tipo de organização, impossíveis de encontrar, e muitos deles à chuva. Parece impossível, mas muitos atletas receberam a sua roupa já totalmente ensopada dentro do saco. Imperdoável! Um erro capaz de custar muitas futuras inscrições, se não for reconhecido por quem de direito e tomadas as devidas ações para que não se volte a repetir.