A culpa foi do "puôbo"
Não ia preparado! Em jeitos de aviso, e para que ninguém se prendesse por minha causa, fui avisando desde cedo, bem antes da prova, que não ia preparado para correr a Maratona do Porto. Primeiro, fiz um plano de treinos, mas não o cumpri. A falta de tempo e as demasiadas coisas que tive para fazer - em dias que insistem só ter 24 horas - não me permitiram fazer mais do que um único treino longo de 30 km, umas semanas antes, e uns treinos mais curtos (mas intensos) pelo meio. Foi o que se pôde fazer. Depois, estava frio, ia chover e não conhecia o percurso. O resultado? A minha melhor maratona até agora! :) Como isso aconteceu é o que eu vou contar de seguida.
A culpa foi dos treinos!
Ainda estou para descobrir se a culpa de ter feito a minha melhor maratona (até agora) foi dos treinos que fiz, ou dos treinos que não fiz. Sim, leram bem, dos treinos que não fiz. Ainda nesta semana que passou, discutia lá no ginásio sobre o excesso de treinos e de corridas que algumas pessoas insistem em fazer, sempre na ânsia de assim se sentirem (mentalmente?) mais capazes de cumprir o seu objetivo. O que é certo é que correr demasiado também faz com que, ao longo do tempo, se acumulem nas pernas quilómetros e mais quilómetros de fadiga muscular. E depois, quem é que tira esse cansaço dos músculos, a tempo de ter uma boa prestação na prova principal? É que até podemos dizer que nos sentimos bem. Mas, "científicamente" falando, as reservas ficam diminuídas e será sempre mais complicado correr assim, do que correr depois de descansar a sério!
Não sei se já aqui contei a história do Carlos Lopes, que foi atropelado enquanto treinava na 2ª Circular, isto 15 dias antes de ir competir na maratona dos Jogos OIímpicos de Los Angeles. Há quem diga que foi graças a esse "descanso" forçado que ele conseguiu ganhar esta prova, aliás, com um recorde que veio a ser seu durante longos anos!
Portanto a culpa pode ser dos treinos que fiz - claro - mas também dos que não fiz.
A culpa também foi do equipamento...
A metereologia já anunciava que ia ser um fim de semana chuvoso. Ora se a isto juntarmos o frio e um pouco de vento, a manhã de domingo prometia não ser a mais amena. Assim, optei por levar uma tshirt térmica, uns manguitos, os calções duplos (boxer + calção) da Salomon e umas sapatilhas com o drop mais baixo com que estava habituado a treinar: 4 mm.
A tshirt térmica foi uma boa opção, porque foi capaz de regular a temperatura corporal ao longo de toda a prova. De facto, mesmo debaixo de chuva, ao tocar na tshirt toda ensopada, podia sentir que esta estava quente e que eu não sentia o mínimo frio, sinónimo de que a regulação da temperatura corporal estava a funcionar bem.
Os manguitos também foram uma boa escolha, porque protegeram contra o vento mais fresco que de vez em quando se fazia sentir, ou não estivessemos nós ao pé do mar. Além disso, se por acaso fizesse calor, seria uma opção fácil de tirar.
Os calções duplos são os calções interiores modulares S/Lab da Salomon que, juntos com o calção de fora, servem de proteção adicional contra o vento e o frio (e a chuva). O Modular Belt é a cereja no topo deste trio, pois encaixa-se com uns clips nos calções interiores e assim mantém-se sempre no mesmo sítio, mesmo se lhe dermos acidentalmente algum puxão ao tirar o gel do interior.
As sapatilhas escolhidas foram umas Saucony Kinvara 9, aconselhadas pelo Ricardo da 4Run, já que estou habituado a correr com sapatilhas de drop baixo, o que me facilita a adopção de um estilo de passada mais natural e coerente com a nossa biomecânica.
Foi também na 4Run que comprei a última moda em nutrição: o gel da Maurten, a tal marca que os "artistas" de elite (como o recordista Kipchoge e tantos outros) agora passaram todos a usar. A permissa desta marca, que só vende 2 produtos (gel e bebida energética) é fornecer o máximo de carbohidratos, com o mínimo de trabalho no estômago, coisa que ultimamente não me tem corrido muito bem em provas (sinto que tenho vindo a ficar cada vez mais intolerante a estas porcarias dos géis e das bebidas energéticas), mas que desta vez passou no teste com distinção! Sem quebras, a única coisa que senti mesmo a falhar nos últimos - vá lá - 5 quilómetros foram as pernas, que se ressentiram da falta de preparação com treinos mais longos. Eu bem me queria manter abaixo dos 4'30/km, mas nesta fase já estava a ser difícil.
A maior culpa foi mesmo do "puôbo"!
Já agora, falando da maratona propriamente dita, a juntar a tudo isto, a grande energia que senti ao longo de toda a prova foi mesmo do público! Já me tinham dito (mas claro, ver para crer) que o público presente na Maratona do Porto não tinha nada a ver com o público presente noutras provas no nosso país. E, de facto, o povo sai à rua para apoiar os atletas desta prova. Desde o tiro da partida, às 09h00, que é impossível não nos sentirmos verdadeiramente levados pelo apoio do público ao longo do percurso. Lembro-me de começar a chover logo no início da prova e de, mesmo assim, a rotunda do Castelo do Queijo ou da Anémona estar rodeada de pessoas a gritar por quem corrida!
E se isto era um facto em Matosinhos, na zona da Ribeira, em Gaia e na Ponte D. Luís... impressionante! Aqui era tanta gente que quase não via a minha mulher a gritar por mim no meio da multidão. E na reta da meta foi igual... gente e mais gente, aplausos e mais aplausos!!!
Assim sim! Assim é fácil correr bem. A todos vós, tiro o meu chapéu. E só espero que da próxima vez o S. Pedro nos dê um pouco mais de descanso e traga menos chuva do que este ano.
Em jeitos de conclusão, só posso acreditar que, por um lado, tudo é possível se trabalharmos de forma focada e consciente para o objetivo que pretendemos conquistar. Por outro lado, ajuda se nos lançarmos de cabeça limpa, sem pensamentos negativos e sempre com um sorriso na cara. Esta positividade é - acreditem - metade do trabalho! E na semana passada, na 15ª Maratona do Porto, bem que posso culpar o "puôbo" por me ter levado "de carrinho" até ao fim da prova. O "puôbo" no Porto, mas também os meus amigos, a minha família, a minha mulher (que apanhou uma grande molha só vir para bater palminhas), e os meus companheiros de corrida. À parte das coisas que não correram nada bem*, a Maratona do Porto é aquela prova que me vai sempre arrancar um sorriso de cada vez que me lembrar dela.
* As coisas que não correram nada bem nesta 15ª Maratona do Porto não tiveram a ver comigo, mas não as posso deixar passar ao lado. Tiveram a ver com a organização que, num dia que já se sabia que ia ser chuvoso à brava, não tomou as devidas previdências e deixou, no final da prova, centenas de atletas durante largas dezenas de minutos (eu fiquei meia hora, mas houve quem tivesse esperado 2 horas) à chuva e ao frio para recolherem o saco de roupa do bengaleiro. Bengaleiro? Não, não havia bengaleiro. Os sacos de roupa estavam no chão, sem qualquer tipo de organização, impossíveis de encontrar, e muitos deles à chuva. Parece impossível, mas muitos atletas receberam a sua roupa já totalmente ensopada dentro do saco. Imperdoável! Um erro capaz de custar muitas futuras inscrições, se não for reconhecido por quem de direito e tomadas as devidas ações para que não se volte a repetir.