O que são e o que fazem os treinos na Zona 2
"O nosso corpo tem dois sistemas básicos para queimar energia. O primeiro é o "sistema aeróbico", que utiliza oxigénio e gordura como combustível. É o mecanismo que nos permite aguentar ao longo do dia e que alimenta a nossa atividade física até um certo nível de intensidade. Quando a intensidade do esforço excede aquilo que é conhecido como o "limiar aeróbico", entra então em ação o sistema secundário, conhecido por "sistema anaeróbico". Utilizado para dar força a esforços mais extremos, como sprints, levantamento de pesos pesados e corridas rápidas, o sistema anaeróbico utiliza o glicogénio - ou açúcar - como energia. Este sistema só pode ser ligado durante cerca de 90 minutos, antes de se desligar novamente, esgotado.
A competência nos desportos de resistência mede-se portanto na consistência com que se desenvolve o sistema aeróbico. Para conseguir isto seria necessário focar-me em treinar especificamente esse sistema, o que significa manter-me na segunda "zona de treino", de entre cinco "zonas" que são estabelecidas pelo teste de lactato, ou análise ao ácido láctico (independentemente da denominação, o objetivo é o mesmo). Para alguém como eu, isso significaria abrandar... abrandar muito. Acabaram-se os treinos de corrida rápida. Os sprints com os amigos nos trails ou na bicicleta. Desse instante em diante, nunca mais deveria subir acima das 140 pulsações por minuto em qualquer corrida. E na bicicleta? No máximo 130 pulsações por minuto. Zona 2. Todo o dia. Todos os dias.
Mas se tudo o que eu fizer é correr devagar, pergunto-me como é que poderei algum dia correr depressa? "O prémio nunca vai para o atleta mais rápido, mas para o atleta que abranda menos." Isto é verdade nos desportos de resistência. E possivelmente mais verdade ainda na vida real.
Após algumas pesquisas, descobri um consenso geral que diz que os treinos consistentes na Zona 2 podem, com o passar do tempo, estimular o aumento da densidade mitocondrial nas células musculares. Percebi que quanto mais mitocôndrias um atleta tiver, melhor será a sua performance ao nível da resistência. Isto porque estas são as únicas células onde os carbohidratos, as gorduras e as proteínas podem ser "partidas" na presença de oxigénio, criando assim energia para o exercício físico. Desta forma, uma proliferação destas mitocôndrias aumenta a eficiência do motor aeróbico e o tempo durante o qual alguém consegue praticar um exercício de resistência. Treinar tempo suficiente na Zona 2 proporciona portanto um aumento do limiar aeróbico - o nível máximo de intensidade, no qual o corpo continua a processar oxigénio e gordura como combustível.
Até ao presente, passava a maior parte das minhas sessões de treino de corrida, natação e bicicleta dentro daquilo a que se chama de "zona cinzenta", uma temível "terra de ninguém" onde o esforço despendido excede aquilo que é necessário para se desenvolver de forma correta o motor aeróbico, mas que também não tem a intensidade necessária para melhorar a velocidade ou aumentar o limiar anaeróbico. É aquele nível de esforço que nos deixa bem dispostos e meio extasiados depois de uma pequena corrida, mas que pouco adianta em termos de melhoria na performance física em geral. Na realidade, esse tipo de treinos até pode mesmo ditar a falta de progresso real. Deixa-nos cansados, com poucos ou mesmo nenhuns ganhos ao nível da velocidade e resistência. Cria patamares que limitam o desenvolvimento atlético e que normalmente leva ao aparecimento de lesões. E é de longe o erro mais comum, praticado pela maior parte dos atletas de resistência.
Noutras palavras, o típico atleta amador de resistência treina demasiado nos dias de treino aeróbico e de recuperação ativa. Mas raramente com intensidade nos dias em que deve praticar essa intensidade. Consegue-se desenvolver um certo nível de capacidade física desta forma, mas nunca se conseguirá atingir todo o nosso potencial."
PS: dito isto, vamos aos treinos à séria?