Normalmente nesta altura do ano faz um calor desgraçado! É normal que assim seja. Afinal de contas estamos em Julho, pico do verão (eu sei que não tem parecido). Quem costuma correr e costuma fazer provas de trail running, conhece bem a tradição que é o calor no Trail do Almonda. Esta prova teve lugar no último domingo e corre-se na Serra d'Aire. No ano passado apanhámos uns históricos quarenta e muitos graus no meio da serra, lembram-se? Este ano, graças à minha capacidade de desorganização, não fui a tempo de me inscrever, mas como se fartou de chover também não fiquei muito triste. Afinal de contas, a tradição é para se manter e, no Trail do Almonda, a tradição pede uma coisa: calor! Como não dava para ir ao Trail do Almonda, optámos por substituir essa prova por outra. Escolhemos o Trail das Zagaias, numa terra que desconhecíamos e organizada por malta que também não sabíamos quem era. Basicamente nunca tínhamos ouvido falar desta prova mas, dada a prontidão e simpatia de quem nos respondia aos emails e os €5 de inscrição (banhos e almoço incluídos), pareceu-nos um bom substituto. No entanto, valores mais altos se levantaram e também não nos foi possível ir a este trail... e sendo assim, apesar da chuva que caía insistentemente no domingo de manhã, optei por sair de casa o mais cedo que pude e fazer um treino pelas redondezas. Fosse isto um dia normal e a questão dos treinos do dia estaria encerrada por aqui. Mas não. Nem isto era um dia normal (como poderia ser, se chovia copiosamente em pleno mês de julho?), nem estamos a falar de pessoas normais (tome-se por pessoas normais, aquelas que não gostam de sair "fora da caixa"). Aqui por casa todos gostam de correr e, se aliarmos a isto um pouco de convívio com amigos que partilham do mesmo espírito que nós, claro que se torna praticamente impossível recusar convites como aquele que nos fizeram para o final do dia: um pequeno treino de trail, entre amigos, pelas redondezas da Serra da Arrábida, com final garantido nas tortas de Azeitão. Como recusar? Impossível! Ainda por cima com o dia bonito que deixava agora ver os primeiros raios de sol. Eram 17h30 e estávamos a sair do ponto de encontro, na Aldeia de Irmãos. Um grupo de 11 pessoas a correr por trilhos bem calcados, em direção à serra, ainda sem uma noção muito concreta do percurso que se iria percorrer. Decorridos os primeiros 2 ou 3 kms de corrida, sempre ladeados por perfume de orégãos e encimado por um sol agora bonito e radioso, aproximávamo-nos em ritmo de treino do sopé da serra, altura em que alguém se propôs a subir até ao pico do Formosinho (500m de altitude), por uma encosta bem conhecida pela "cascalheira". Se não conhecem a cascalheira, imaginem uma encosta tão inclinada que, para se conseguir subir, só se formos praticamente de gatas e com as mãos a puxar pelo chão. A juntar a isto, dá-se o nome de cascalheira porque o solo é formado por cascalho, pedras soltas que, ao mais pequeno descuido, deslizam encosta abaixo, levando uma enxurrada de pedras e - se não temos cuidado - nós próprios. Mas como um dia alguém se lembrou de dizer "diz-me com quem andas, dir-te-ei quem és", lá nos fizemos todos juntos à aventura. Mais ou menos a meio da aventura, já não sabíamos se o melhor era continuar a subir ou voltar para trás. Alguns mais habilidosos nas artes da escalada lá subiam, com mais ou menos dificuldade, entre o cascalho e penedos da serra, fazendo a Serra da Freita parecer um desafio fácil. Mas outros não arriscavam e iam ficando para trás, o que fez com que passadas umas dezenas de minutos, enquanto uns continuavam a subir, outros já tinham optado por descer até à base da dita cascalheira. Se é perigoso? Sim, é perigoso, há que o reconhecer. É perigoso embarcar numa aventura destas sem - no mínimo - se conhecer o caminho como a palma das nossas mãos, com a agravante das horas irem passando e já não termos muita disponibilidade de tempo para encontrar um caminho certo para chegar ao topo e encontrar um caminho mais "dócil" para voltar a descer. Sim, porque voltar pela cascalheira parecia estar fora de questão. Mas claro que as aventuras têm sempre um lado gratificante. Não, ainda não vou falar das tortas de Azeitão. Vou falar da sensação da chegada ao marco geodésico no pico do Formosinho, na vista, nas fotografias, nas boas emoções que se podiam ver pelos sorrisos de todos nós. Depois desta pequena-grande conquista, voltar a descer foi brincadeira de crianças e decerto que voltar a subir (ok, por outro caminho mais "corrível") até lá acima ficou na ideia de alguns de nós. Na minha pelo menos sei que ficou!... Quem me acompanha? Quem me conhece sabe que para mim é praticamente impossível falar de corridas e não falar de quem me acompanha. E mesmo que corra sozinho, certamente tenho sempre alguns Seres especiais que sempre me acompanharão, se não em presença, com certeza que no coração. Ontem contámos com a companhia uns dos outros. Fosse enquanto corríamos todos juntos, fosse quando só alguns alcançavam o topo e iam dando notícias para tranquilizar os restantes, fosse no brinde final a acompanhar a recompensa do treino, na forma de uma deliciosa torta de Azeitão. Tenhamos nós sempre a sorte de andarmos bem acompanhados a fazer aquilo que nos faz felizes e andaremos sempre com um sorriso no rosto e outro no coração. Porque isso é em grande parte aquilo que me faz gostar destas "correrias". Já agora, fica a imagem com o percurso da subida a vermelho e o percurso da descida a verde (cliquem na imagem para aumentar). Quando é o próximo treino?