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Ex-Sedentário - José Guimarães

A motivação também se treina!

Ter | 28.12.21

Saber quando parar...

José Guimarães

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Parar de correr, ou descansar um ou dois dias, não vos vai tornar mais fracos. Na verdade, acontece exatamente o oposto. Saber parar significa - acima de tudo - ser paciente e estar em sintonia com o vosso próprio corpo. Significa não forçar os limites, ao ponto de poderem vir a sofrer uma lesão crónica como a que estou a experimentar neste momento. Em vez disso, significa poderem continuar a praticar a vossa modalidade favorita, tendo em conta um interesse maior, que acima de tudo deve ser continuar a correr.

No entanto, em modalidades como a corrida, esta abordagem pode ser um pouco como remar contra a corrente. Basta procurarem por algumas citações na internet e vão encontrar coisas como: “Corra quando puder; ande se for preciso; gatinhe se não puder mais; mas nunca desista.” - Dean Karnazes

São ótimas citações, muito inspiradoras, mas todas elas transmitem uma mensagem do tipo "no pain, no gain", que já está mais do que provada que não é de todo a mensagem mais correta. Infelizmente parece que há toda uma espécie de honra para aquelas pessoas que treinam muito e que - consequentemente - se lesionam. Talvez porque o "ego" fala mais alto e se passarem por isto, todos vos vão considerar pessoas "mentalmente fortes" e "altamente motivadas" (está na moda!). Temos alguma tendência para glorificar as lesões relacionadas com o desporto como se fossem medalhas, um símbolo do compromisso... todos temos claramente algum trabalho a fazer.

Nunca estivemos tão bem informados sobre a prevenção de lesões e as melhores práticas de saúde e bem-estar que levam a uma vida ativa e sustentável. Mas às vezes os problemas acontecem, independentemente da abordagem. Podem até estar a treinar com sabedoria e ainda assim sentir algum desconforto físico. Como tal, existem alguns sinais claros de que devem mesmo parar de correr, ou pelo menos diminuir drasticamente o volume das vossas corridas. Este artigo pretende mostrar-vos quais são e, dessa forma, servir como um ponto de partida para se tornarem mais sintonizados com as necessidades específicas do vosso corpo.

São três fatores de risco importantes que todos os corredores devem ter em atenção. Sabendo que o corpo de cada pessoa é diferente, a minha sugestão vai no sentido de agarrarem no que fizer mais sentido e deixarem de lado o que não fizer. Se estiverem a passar por algum deles, pode estar na hora de fazerem uma pausa e considerar as vossas prioridades:

1) Problemas "mecânicos"

Se estão a braços com algum disfunção músculo-esquelética, é melhor fazerem uma pausa. No meu caso, um encurtamento em alguns músculos e ligamentos ao nível da anca fez com que me ressentisse mais da carga que coloquei na Meia Maratona de Cascais, da qual ainda não recuperei.

Podem ver na imagem abaixo, tirada durante a prova, o completo desalinhamento da linha dos ombros, anca, coluna e fémur, nada paralelos (apesar do tornozelo bem apoiado e sem pronação excessiva). Como consequência sofri uma lesão na origem do tensor e glúteo médio do lado esquerdo (direito na foto):

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Foto: @runffwpu

Podem também ler o artigo "Meia Maratona de Cascais: o calçado, a glucose e os treinos"

Aqui fica uma lista com as lesões mais problemáticas, onde recomendo uma atenção profissional:

  • Joelho de corredor
  • Tendinite no tendão de aquiles
  • Encurtamento nos músculos posteriores das coxas
  • "Canelites"
  • Síndrome da banda iliotibial
  • Fraturas de stress
  • Fasceíte plantar
  • E a lista continua...

Não devem continuar a correr nestas condições, principalmente se o nível de dor já estiver alto. Se for este o caso, façam uma pausa e procurem um perito enquanto as coisas estão "frescas". Lesões crónicas não são brincadeira e infelizmente, ainda vejo muita gente que continua a correr, apesar da dor. 

Se não estão certos do potencial de lesão, utilizem uma escala de dor, tal como fazem com o esforço nos treinos. Escutem o corpo e categorizem a dor numa escala de 1 a 10. Se estiverem acima de 3 ou 4, pode ser um indicador de algo pior do que uma simples dor ou rigidez muscular.

2) Doença ou privação de sono

Esta é meio controversa. Tal como partilhei no artigo “Posso correr com uma constipação… ou não?”, usem as dicas que vos passei, mas usem o bom senso acima de tudo. Se sentirem que está a ser um grande esforço, voltem para a cama. Sintomas persistentes são sinais de alerta e, se acontecerem durante um exercício simples ou leve, mais ainda! Vão para casa, descansem, hidratem e alimentem-se bem.

No entanto há provas que o exercício moderado pode melhorar o sistema imunitário. Se estiverem saudáveis, devem procurar manter um regime de exercício regular (mínimo 3x/semana) de atividade aeróbica, por forma a prevenir doenças.

Se estão a passar por uma fase de privação de sono e só conseguem dormir 3 ou 4 horas por noite, é natural que a atividade aeróbica vos deixe mais vulneráveis. A qualidade do treino vai ser muito mais baixa devido à fadiga física e mental acumulada, bem como uma percepção de eforço afetada. Apesar de correr poder ser bom para vos dar um “boost”, nunca vai ser um remédio sustentável para a falta de sono. A melhor coisa a fazer nestes casos é tentar dormir bem durante várias noites.

Se não têm tempo para dormir bem e fazer exercício de forma adequada, talvez o melhor seja mesmo priorizar as coisas de forma diferente.

3) Falta de estímulo

Se perderam aquela alegria de correr, é mesmo tempo de fazer uma pausa. Não forçar. A natureza competitiva desta modalidade pode levar por vezes a sentimentos de frustração, comparações nada saudáveis e até esgotamento.

Se estão a sentir algumas destas emoções, perguntem-se a si próprios: porque é que correm? É para se sentirem realizados, ou é para provar algo aos outros? Quem passa por sentimentos de culpa ou mesmo falta de prazer, estão mais suscetíveis a sofrer lesões ou algum tipo de esgotamento.

Antes de se lançarem em novos voos nas vossas corridas, certifiquem-se que o estão a fazer pelas razões corretas.

Se perderem a alegria de correr, é provável que a corrida se torne mais um fardo, do que um prazer.